Poderíamos,
com mais frequência, tentar deixar a vida em paz para desembrulhar suas flores
no tempo dela, no tempo delas, e, em alguns momentos, nem desembrulhar. Apesar
da nossa cuidadosa aposta nas sementes, algumas simplesmente não vingam e isso
não significa que a vida, por algum motivo, está se vingando de nós. Há muito
mais jardim para ser desembrulhado.
Poderíamos,
mais vezes, tentar respeitar os dias e as noites das coisas, os sóis e as luas
de cada uma, os amanheceres, os entardeceres, as madrugadas, a sabedoria
reparadora e tecelã dos intervalos, as estações todas com seus jeitos todos de
dizer. Percebermos, mais vezes, a partir da nossa própria experiência humana,
que tudo o que vive, queira ou não, está submetido à inteligência natural e
engenhosa das fases. Dos ciclos. Da permanente impermanência. Da mudança.
Poderíamos,
amiúde, tentar desviar nossa atenção do relógio perigoso da expectativa,
geralmente adiantado demais. Aquele tal cuja velocidade transtornada dos
ponteiros costuma apontar para o tamanho e a urgência das nossas carências.
Para a necessidade de preenchimento imediato e contínuo do que chamamos de
vazio, às vezes porque é, às vezes por falta de palavra melhor. Aquele tal
relógio que geralmente só antecipa frustração e atrasa sossego. Aquele tal que
costuma só fomentar dificuldades e alimentar fomes.
Mas,
não. A crisálida ainda está se acostumando com a ideia de ser borboleta e já
queremos que voe. A flor ainda é botão e, em vez de apreciá-la como botão,
ficamos apressados para vê-la desabrochada. O fruto ainda precisa amadurecer,
mas o arrancamos, verde, do pé, por mera ansiedade. Ainda é a vez do tempo
estar vestido de noite, mas queremos que se troque rapidinho para vestir-se de
manhã.
Nossa
impaciência, nossa pressa avida pelo resultado das coisas do jeito que
queremos, no tempo que queremos, geralmente altera o sábio fluxo do tempo da
vida e o desdobramento costuma não ser lá muito agradável. Não é raro, nós o
atribuímos à má sorte, ao carma, ao mau-olhado. Não é raro, culpamos Deus, os
outros, os astros, os antepassados. Não é raro, é claro, nós ainda nos achamos
cobertos de razão.
É
fácil lidar com isso? Não é não. Nem um pouco. Esse é um dos capítulos mais
difíceis do livro-texto e do caderno de exercícios: o aprendizado do respeito
ao sábio tempo das coisas.
(Ana Jácomo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário